POLUIÇÃO

50 mil pessoas morrem por ano no Brasil

01/02/2021

Segundo o estudo “O Estado da Qualidade do Ar no Brasil”, elaborado por um grupo de cientistas e especialistas no tema, como o físico Paulo Artaxo e a Dra. Evangelina Vormittag, entre outros, sob coordenação do WRI Brasil, a falta de uma política pública nacional sobre o controle da poluição do ar, associada a fragilidades jurídicas e a ausência de um cronograma claro de redução dos poluentes provoca a morte de mais de 50 mil brasileiros anualmente. "A pandemia da COVID-19 poderá ser interrompida com a vacina, mas a poluição do ar continuará matando se nada for feito. Estamos falando de um problema sistêmico, profundo e extremamente letal, para o qual a vacina é políticas públicas adequadas", alerta Carolina Genin, diretora do programa de Clima do WRI Brasil. A má qualidade do ar foi apontada como o segundo maior perigo ambiental global à vida humana, perdendo apenas para a pandemia, e voltará ao topo do ranking quando o vírus for combatido. “Para piorar ainda mais este cenário, estudos correlacionam o ar tóxico como um fator de agravamento da COVID-19 e de sua letalidade", explica Evangelina Vormittag, Diretora Executiva do Instituto Saúde e Sustentabilidade, médica e representante da Coalizão Respirar, uma das autoras do estudo. 

No Brasil, em apenas seis regiões metropolitanas, onde estão 23% da população total do País, a poluição provocará a morte de aproximadamente 128 mil pessoas entre 2018 e 2025. Sem esse contingente de pessoas, as perdas de produtividade seriam da ordem de R$ 51,5 bilhões. Mas não se trata apenas de mortes: serão quase 70 mil internações públicas que custarão quase R$ 130 milhões ao Sistema Único de Saúde. 

Os custos associados a mortes prematuras correspondem a 3,3% do PIB do Brasil em 2015 (quase R$ 6 trilhões), mas os impactos da poluição do ar sobre a economia também abrangem a perda de produtividade de trabalhadores, menor aquisição de habilidades cognitivas relevantes e perdas na produtividade agrícola. Além disso, o ozônio troposférico é responsável por perdas consideráveis na produção agrícola, em especial em regiões peri-urbanas e as afetadas por queimadas associadas a mudança de uso do solo. 

Segundo o estudo, os índices de qualidade do ar estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde não são atendidos na maioria das grandes cidades brasileiras, e não existem penalidades se a legislação não é cumprida pelos órgãos competentes. "Há uma grande lacuna entre as responsabilidades estabelecidas pelo PRONAR e a implementação de ferramentas em nível estadual. Embora o programa nacional exija a implementação de uma série de ferramentas e políticas em nível estadual, estas não se traduzem em realidade", informa o estudo. Atualmente, com a pandemia COVID-19, a poluição do ar é considerada a segunda maior causa ambiental de doenças e mortes prematuras em todo o mundo. Os impactos da poluição do ar na saúde humana estão conectados com doenças pulmonares, cardiovasculares, acidentes vasculares cerebrais, disposição ao câncer e ao diabetes, prejuízo no desenvolvimento cognitivo em crianças e demência em idosos. Segundo levantamento da Organização Mundial de Saúde, mais de 90% da população mundial não respira ar de qualidade aceitável e está exposta a riscos diários, resultando em 7 milhões de mortes anuais, ou cerca de 11,6% de todas as mortes no planeta. Desse total, 600 mil são crianças. Esses números são 15 vezes maiores que o número de mortes causadas por guerras e outras formas de violência. Poluentes como ozônio, metano e carbono negro contribuem tanto para a poluição do ar quanto para a mudança do clima. Essa sobreposição é importante e aponta áreas onde os ganhos no controle destes poluentes, conhecidos como poluentes climáticos de vida curta, geram benefícios tanto em termos de qualidade do ar quanto para a mitigação das mudanças climáticas. 

A poluição do ar no Brasil Central e Amazônia é provocada principalmente pelas queimadas e incêndios florestais. Os níveis da poluição do ar gerada pelas queimadas na região amazônica chegam a atingir valores de PM10 de 500 micrograma/m3, o que representa cerca de 25 vezes mais poluição do que a média normal da região (20 micrograma/m3). O desmatamento da Amazônia é também a principal fonte de emissão de gases de efeito estufa no Brasil. 

A queima de biomassa decorrente das áreas desmatadas e da manutenção de pastos também libera grandes quantidades de material particulado - um dos principais causadores de doenças do aparelho respiratório que ocorrem no período de seca na Amazônia. Apenas entre julho e outubro de 2019, foram mais de duas mil internações por doenças respiratórias diretamente relacionadas a queimadas, sendo que os mais afetados foram bebês (21%) e pessoas com mais de 60 anos (49%). Em agosto de 2019, quando foi registrado um dos maiores picos no número de focos de calor no mês desde 2010, cerca de três a quatro milhões e meio de pessoas foram expostas ao material particulado fino gerado pelas queimadas além dos limites estabelecidos como nocivos para a saúde. A poluição do ar relacionada às queimadas e ao desmatamento implicou em um custo para o SUS de cerca de US$ 1,5 milhão em 2019. 

O material particulado acaba afetando a qualidade do ar em outras regiões, já que ele segue as correntes de ar que atuam na Amazônia e que leva a umidade da região para o Centro-Oeste, Sul e Sudeste do Brasil, conhecidas como rios voadores. Além disso, o material particulado aumenta a disponibilidade de partículas na atmosfera que interferem na formação das gotículas de chuva, de forma que elas acabam demorando mais para atingir o tamanho ideal, ou para evoluírem como gotícula e precipitar como chuva, gerando um ciclo vicioso entre queimadas e seca. 

O aumento da pobreza no Brasil fez diminuir o consumo de gás para a preparação de alimentos e, segundo o estudo, isto é preocupante. As pessoas têm aumentado o uso de madeira, resíduos de poda de plantas, lixo e outros produtos, e eles são ineficientes na queima, gerando muitos poluentes. A queima desses produtos atinge mais as mulheres, crianças e idosos, que passam mais tempo em casa. Dados da Empresa de Planejamento Energético (EPE) estimam que quase 1/4 de toda a energia residencial no país vem do uso de lenha. Segundo o IBGE, em 2018 foram 14 milhões de famílias usando lenha ou carvão para cozinhar, um aumento de 3 milhões em relação a 2016. 

Outra importante fonte de poluentes do ar é o transporte rodoviário de cargas e pessoas. Aproximadamente 63% dos deslocamentos urbanos em cidades com mais de 1 milhão de habitantes em 2018 e 65% da movimentação de cargas em 2015 se deu sobre quatro rodas. Nos últimos dez anos, o segmento de transportes apresentou a maior taxa média de crescimento de consumo de energia, tornando-se, a partir de 2018, o principal consumidor de energia do país. Segundo o estudo, não é apenas quantidade, mas a má qualidade do transporte. Os automóveis representam apenas 25% do total de viagens no Brasil e consomem 60% do total de energia destinada à mobilidade urbana. O mesmo se aplica ao transporte de carga, no qual o consumo de combustível para transportar uma tonelada de carga por caminhões é 2,7 vezes maior do que o consumo dos trens.