BRUMADINHO

Debate sobre dois anos do acidente

28/01/2021

Para relembrar os dois anos do rompimento da barragem em Brumadinho, a Fundação SOS Mata Atlântica realizou, dia 20 de janeiro, às 18h30, webinar para debater a situação atual em Brumadinho e reforçar que uma tragédia deste tamanho não pode ser esquecida, pelo impacto junto às famílias e ao meio ambiente. "A tragédia de Mariana foi o início da de Brumadinho. A Vale sabia dos problemas desde 2007. Eu paguei um preço muito alto em 2015, quando falei que haveria outras tragédias. Era uma questão de tempo. A estrutura e o sistema de fiscalização e controle continuavam o mesmo. O resultado que se vê é que depois se faz um acordo, e tudo volta ao status habitual", afirmou o promotor de Justiça Carlos Eduardo Ferreira Pinto, coordenador da área de Meio Ambiente do Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG), que em 2015 era responsável pelas investigações em Mariana como coordenador do Núcleo de Resolução de Conflitos Ambientais (Nucam). Em Brumadinho, 16 pessoas foram denunciadas, sendo 11 da Vale, cinco da TÜV Süd, além das próprias empresas. A denúncia foi por homicídio duplamente qualificado em razão do perigo comum, multiplicado por 270 vezes - o número de vítimas. 

A jornalista Cristina Serra, autora do livro "A Mata Atlântica e o Mico-Leão-Dourado" e colunista da Folha de S. Paulo, foi a moderadora do evento e ainda destacou os dois nascituros, uma vez que duas mulheres gestantes estão entre as vítimas do desastre. Para Marina Oliveira, moradora da região e coordenadora de Projetos para as comunidades atingidas pelo rompimento da barragem da Vale pela Arquidiocese de Belo Horizonte, a centralidade das tratativas está na empresa, enquanto deveria ser com foco nos moradores locais, principalmente aos atingidos, que precisam ter suas necessidades ouvidas e atendidas. Mariana diz que a Vale é quem controla o acesso à informação, negocia acordos com o governo de Minas Gerais sem a participação das famílias afetadas, além de realizar diversas estratégias para dificultar a reparação para quem teve sua vida totalmente alterada após o crime da empresa. "O crime não ficou no dia 25, ele é continuado. As violações de direito continuam acontecendo no território. Começa pela falta de comunicação com as comunidades, passa pelo acordão que está sendo negociado neste momento entre Vale e governo Zema sem participação dos atingidos, pelo controle que a empresa tem nas metodologias de análise dos impactos nas áreas contaminadas, inclusive sem dar acesso aos laudos e até ao abastecimento de água nos municípios que foram impactados, mas não são reconhecidos pela empresa”. 

Outro ponto debatido no webinar foi a análise ambiental sobre o rio Paraopeba e seus afluentes. "Ninguém sabe como e se o ecossistema local vai se refazer. Cadê o investimento na ciência? Nós somos uma rede de monitoramento independente e temos ajudado com nossas informações. Mas onde estão as informações da empresa que não chega na comunidade? No final, a empresa fica com bônus e o estado com o ônus de ter que gastar seus recursos", afirmou Marta Marcondes, professora da Universidade Municipal de São Caetano do Sul e coordenadora do Laboratório de Análise Ambiental do Projeto Índice de Poluentes Hídricos (IPH). A jornalista Cristina Serra lembrou uma frase marcante que um perito disse para ela em Mariana: "A lama de rejeito de mineração é uma lama biocida, que mata todas as formas de vida". Ela também destacou que "o lucro é privado e o prejuízo é socializado".

Mais um ponto de destaque no webinar foi sobre os futuros presidentes da Câmara e do Senado, para que estejam atentos e compromissados com o que a sociedade quer. Um dos temas relevantes é o licenciamento ambiental, com total relação com a mineração. Ele deve permitir transparência, a participação da sociedade na tomada de decisões, impedindo que atos criminosos como esse ocorram. "Aqueles que dizem que o licenciamento ambiental e a governança participativa do meio ambiente e da água são instrumentos que impedem o desenvolvimento, olhem para essas tragédias anunciadas que o Brasil tem. Se a boiada continuar passando sob essas legislações, a tendência é que novos danos se repitam. Para evitar isso é que nós estamos aqui. Esse é o papel da sociedade civil e a maior contribuição da SOS Mata Atlântica para devolver o verde, não só à mata, mas uma esperança para a nossa bandeira e um futuro sustentável no país", destacou Malu Ribeiro, diretora de Políticas Públicas da SOS Mata Atlântica.

A comunidade está realizando a II Romaria Regional pela Ecologia Integral a Brumadinho, construída pela Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário (RENSER), vinculada à Arquidiocese de Belo Horizonte. Os moradores da região também estão lançando vídeos-carta e um Pacto dos Atingidos. Maiores informações pelo link https://www.instagram.com/regiao_renser/. A Fundação SOS Mata Atlântica deve voltar à região para monitorar a qualidade da água do Rio Paraopeba, assim que o cenário de pandemia permitir. "Vamos levar informação independente e ciência cidadã para as comunidades, além de continuar atentos no âmbito legislativo, com a Frente Parlamentar Ambientalista", finalizou Malu Ribeiro.