AMAZÔNIA

As feridas deixadas pelas queimadas

19/07/2019
Segundo estudo científico publicado por pesquisadores brasileiros, norte-americanos e alemães na revista "Global Change Biology”, as florestas da Amazônia impactadas por queimadas demoram até sete anos para recuperar sua capacidade de bombear água para a atmosfera e absorver carbono. 
 
Os cientistas analisaram dados de um experimento conduzido pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) em uma fazenda em Mato Grosso. Nas áreas atingidas por queimadas controladas, as árvores grandes sobreviventes ao fogo sucumbiram rapidamente nos anos seguintes, por se tornarem mais fracas e vulneráveis a doenças e rajadas de vento, especialmente nas bordas da mata. “Essas feridas na floresta podem deixar cicatrizes permanentes, com menos árvores e carbono”, explica o principal autor do artigo, o brasileiro Paulo Brando, do IPAM. Nos anos seguintes também foram constatadas mudanças na composição de espécies, além de invasão de gramíneas no local. 
 
A partir do sétimo ano, os cientistas observaram uma mudança no quadro: aquela área retirava tanto carbono da atmosfera e jogava umidade no ar quanto antes do fogo. “Para se recuperar, as plantas trabalham muito rápido, têm muita fotossíntese, por isso tiram muito carbono do ar e transpiram bastante”, explica o pesquisador Michael Coe, do Instituto de Pesquisa de Woods Hole, nos Estados Unidos, um dos autores do estudo. “Mas perdemos o carbono que estava estocado nas árvores mais antigas”. O resultado mostra a importância de deixar áreas queimadas na Amazônia se recuperarem, o que ajuda a estabilizar o clima local – na região do estudo, sudeste da Amazônia, a estação seca é duas semanas mais longa do que 30 anos atrás. “Poucos estudos documentaram a recuperação da floresta após distúrbios múltiplos, o que ajuda a prever as trajetórias das funções florestais no futuro”, diz a cientista Susan Trumbore, do Instituto Max Planck de Biogeoquímica, coautora da pesquisa.
 
O pesquisador brasileiro alerta para a necessidade de se acompanhar as áreas queimadas por mais tempo, para saber se elas vão se recuperar totalmente ou se a vegetação será um híbrido de floresta com gramíneas – o que, por sua vez, deixa a área mais suscetível a novos incêndios. Na Amazônia, o fogo ocorre naturalmente em determinada área a cada 500 anos, no mínimo. Porém, hoje algumas regiões queimam anualmente ou com poucos anos de diferença, devido à ação humana. O desmatamento e as queimadas são a principal fonte de emissão de gases do efeito estufa no Brasil, o que intensifica as mudanças climáticas.